quinta-feira,
31 de julho de 2025

Política

Fake news, voto impresso e quarentena: os nós políticos do novo Código Eleitoral

Redação

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) pode retomar no segundo semestre a votação do novo Código Eleitoral (PLP 112/2021), adiada novamente após longo debate na última reunião, em 9 de julho.  

Relatado pelo senador Marcelo Castro (MDB-PI), o projeto de autoria da deputada federal Soraya Santos (PL-RJ) reúne e atualiza sete leis sobre o processo eleitoral brasileiro, mas ainda enfrenta divergências em temas centrais como fake news, voto impresso e quarentena para agentes públicos que desejam se candidatar. 

O relator segue confiante de que a proposta possa ser votada ainda neste ano. A proposta tem 877 artigos e busca consolidar toda a legislação eleitoral vigente. 

— É um código moderno, que reúne normas espalhadas em várias leis. Serão revogadas sete leis para criar uma legislação única — explicou Castro em entrevista para a TV Senado. 

Ele defendeu que mais de 90% do conteúdo já tem apoio entre os senadores, mas reconheceu que os três temas mais sensíveis precisam ser tratados com negociação ou levados a voto. 

Impasses 

O primeiro ponto de discórdia é a regulamentação da divulgação de fake news durante campanhas eleitorais. Para o relator, o direito à liberdade de expressão não pode ser confundido com permissão para divulgar informações falsas que interfiram no resultado das eleições. 

— Não existe liberdade absoluta. O mundo inteiro está discutindo isso. A União Europeia já impõe multas milionárias a políticos que divulgam conteúdo falso. Os Estados Unidos também têm projetos nesse sentido — destacou o senador. 

Outro ponto é a proposta de quarentena obrigatória para agentes públicos como juízes, promotores, policiais, delegados e militares. Pela proposta atual, essas categorias teriam de se afastar do cargo dois anos antes das eleições. 

A medida divide opiniões no Senado. Para Marcelo Castro, essas carreiras exigem isenção e não podem ser confundidas com a atividade político-partidária. 

— São funções que devem prezar pela imparcialidade. Um delegado não pode investigar um adversário político e, depois, ser seu concorrente nas urnas — justificou. 

O terceiro item é a retomada da discussão sobre o voto impresso. O relator reafirmou que o sistema eletrônico brasileiro é seguro, já foi auditado em diversas ocasiões e nunca apresentou fraudes. 

— Foram quinze eleições com urna eletrônica e nenhuma fraude comprovada — afirmou. 

Ele defende que a insistência na pauta do voto impresso atrasa o debate e reforça discursos infundados de desconfiança no processo eleitoral.  

Espaço para avanços e prazo curto 

Na avaliação do consultor legislativo Arlindo Fernandes, especialista em Direito Constitucional e Eleitoral, há ambiente para construir acordos e votar o novo código, desde que as divergências sejam destacadas para deliberação separada. 

— É um projeto longo, mas com amplo consenso na maior parte do texto. Os itens controversos podem ser destacados e votados nominalmente — explicou durante conversa com a Agência Senado

Segundo Arlindo, o texto revoga legislações antigas, como o Código Eleitoral (1965), a Lei dos Partidos Políticos (1995), a Lei das Eleições (1997) e a Lei da Ficha Limpa (2010), entre outras. 

Ele lembra que, para que o novo código entre em vigor já nas eleições de 2026, o Congresso precisa concluir a votação até o início de outubro deste ano. 

— É uma corrida contra o tempo. O Senado precisa votar agora em agosto, para que a Câmara analise as mudanças e a sanção presidencial ocorra dentro do prazo de um ano antes do pleito — detalhou.  

Fake news e legislação penal: distinções necessárias 

Sobre as críticas à inserção do crime de divulgação de fake news no Código Eleitoral, Arlindo esclareceu que a tipificação — classificação de determinada conduta como crime — já existe na legislação atual, dentro do atual Código Eleitoral, e é diferente dos crimes contra a honra, que pertencem ao Código Penal. 

— Divulgar fatos sabidamente inverídicos com objetivo eleitoral é um crime específico, de natureza eleitoral, e não se confunde com calúnia, injúria ou difamação — observou.  

Quarentena reforça o papel de agentes do Estado 

O consultor também rebateu as críticas à quarentena exigida para algumas carreiras públicas. Para ele, a exigência de afastamento mais longo é um reconhecimento da importância institucional dessas funções. 

— Não se trata de penalizar juízes, promotores ou militares, mas de reconhecer que essas categorias são essenciais ao Estado. Justamente por isso, precisam de um tratamento diferenciado — argumentou.  

Voto impresso já foi testado 

Sobre o voto impresso, Arlindo lembrou que o Brasil já testou esse sistema em 2002, sem nenhuma divergência entre os votos registrados e os votos impressos. 

— Foi um exercício técnico. Mais de cinco milhões de votos foram impressos em algumas regiões, e não houve um único caso de inconsistência — disse. 

Para ele, retomar a impressão em todos os votos tornaria o processo mais lento, caro e vulnerável a problemas técnicos, sem oferecer ganhos reais à segurança do sistema. 

Participação feminina: entre avanços e preocupações 

Outro tema que tem gerado debate na CCJ é a reserva de vagas para mulheres. O texto do relator mantém a exigência de 30% de candidatas nas chapas, mas também reserva 20% das vagas efetivamente eleitas às mulheres. 

O que tem motivado as críticas é a retirada da punição para partidos que não conseguirem cumprir o percentual de candidaturas. Segundo Arlindo, a nova regra prevê apenas a perda da vaga não preenchida, sem impugnação da chapa. 

— É importante esclarecer que se o partido não encontrar candidatas, terá menos candidatos, mas não será penalizado de forma mais grave — detalhou.  

Limites à atuação da Justiça Eleitoral 

Alguns senadores também têm expressado desconforto com o que chamam de “protagonismo excessivo” da Justiça Eleitoral. 

O projeto estabelece que mudanças na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) obedeçam ao princípio da anualidade, ou seja, só produzam efeitos nas eleições que forem realizadas após um ano de publicação de novas regras. 

De acordo com o consultor legislativo, o substitutivo — emenda do relator que substitui todo o projeto original — apresentado por Marcelo Castro busca limitar as resoluções do TSE sem ferir a separação dos poderes. 

— Propostas inconstitucionais, como permitir ao Congresso sustar decisões judiciais, foram retiradas pelo relator. O texto atual respeita o equilíbrio entre os Poderes — ressaltou.  

Tramitação 

O PLP 112/2021 foi aprovado na Câmara em 2021 e aguarda votação na CCJ. Caso aprovado na comissão, seguirá para o Plenário. Por se tratar de projeto de lei complementar, exige ao menos 41 votos favoráveis para ser aprovado. 

A expectativa do relator é que a votação na comissão ocorra ainda em agosto, para garantir tempo hábil de promulgação antes de outubro e validade nas eleições gerais de 2026. 

Fonte: Agência Senado

Comentários

Os comentários são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site, e nos reservamos o direito de excluir. Não serão aceitos comentários que envolvam crimes de calúnia, ofensa, falsidade ideológica, multiplicidade de nomes para um mesmo IP ou invasão de privacidade pessoal / familiar a qualquer pessoa.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Confira mais Notícias

Política

Alívio para Cachoeiro: Ferraço comemora isenção do setor de rochas do tarifaço imposto por Trump

Política

Vice-prefeito participa de reunião setorial e alerta para impacto da tarifa dos EUA no setor de rochas de Cachoeiro

Política

Prefeito de Marechal, Lidiney Gobbi, encerra audiências para elaboração do Plano Plurianual

Política

Ao lado do prefeito Hugo Luiz, Casagrande autoriza importantes investimentos em Alfredo Chaves

Política

Discussões sobre IOF continuam no segundo semestre do Legislativo

Política

“Vamos criar esse comitê para analisar todas as decisões e medidas adotadas pelo Governo Federal em resposta às tarifas impostas pelo governo norte-americano”, diz Casagrande, após cria comitê para enfrentar tarifas de Trump

Política

Oposição acusa Moraes de “abuso de autoridade”; líder do PT comemora vitória do “Estado de Direito”

Política

PF cumpre mandados na casa de Jair Bolsonaro, que usará tornozeleira